És um fã? Gostas de fan-service? Claro que gostas. Que fã é que não gosta de fan-service? Se gostas de fan-service (e eu sei que gostas) então Esquadrão Suicida é para ti. Esquadrão Suicida é um daqueles filmes que foi meticulosamente pensado para agradar aos seus fãs. Todas as peças do filme encaixam perfeitamente umas nas outras, como uma engrenagem bem oleada que produz divertimento. Porque é isso que este filme tem de melhor! É muito, muito divertido!
Em primeiro lugar, a premissa do filme é extremamente cativante. Pegar nos piores vilões que existem e usá-los para combater outros vilões ainda piores! Pôr vilões no plano da frente, torná-los personagens principais, dar-lhes o foco e atenção que habitualmente é reservado aos heróis. É uma excelente ideia, e logo à partida eu fico entusiasmado para ver o filme. O enredo é extremamente simples, muito directo. Não há muitos desvios, muito poucos sub-enredos, tem os twists que precisava de ter, mas essencialmente a história existe para funcionar como palco para vermos estas personagens a interagirem umas com as outras.
A narrativa é igualmente descomplicada, baseando-se muito fortemente na estrutura clássica dos três actos, com algumas sequências de flashback a explicar a história de algumas personagens. Não há nada de subtil nesta narrativa nem na maneira como a história é contada. A maior parte das coisas são explicadas com todas as palavras, há vários momentos em que alguém pára para fazer o ponto da situação do enredo, há coisas que são relembradas só para ter a certeza que ninguém se esqueceu delas. Há alguns momentos em que isso atrapalha um pouco o ritmo do filme, mas não é grande coisa.
É neste aspecto que eu aponto uma das poucas coisas de que não gostei particularmente. Há muitas coisas que são explícitas que poderiam ter sido implícitas, muitos temas de subtexto que são tão óbvios que passam a ser só texto. No entanto estou inteiramente preparado para assumir que se calhar esse subtexto está lá, e fui eu que não o vi. Acredito perfeitamente que com mais um dia ou dois para digerir o filme e que com mais um ou dois visionamentos não comece a encontrar coisas mais subtis. Nesta primeira visualização, no entanto, não vi nada disso. Mas isso não é um erro, não é uma falha. Foi claramente uma decisão de escrita que tem o propósito de tornar a história grande e espalhafatosa e barulhenta, e isso não é uma coisa má. É isso que em parte contribui para que o filme seja tão divertido.
De igual forma a realização e a fotografia do filme são excelentes. Há vários planos e composições muito bem construídas, muito dinâmicas. O mundo do filme está fantasticamente bem visualizado e representado, o tom é escuro e opressivo quando precisa de ser, a estética está muito coerente e é muito interessante. A prisão de Belle Reve, em particular, está muito bem caracterizada.
As sequências de acção são tão incrivelmente divertidas. São das melhores coisas do filme, muito bem coreografadas, muito divertidas, fáceis de compreender sem que percam energia ou ritmo. Cada personagem tem oportunidade de mostrar os seus poderes ou estilo de luta, vêmo-las a lutar entre si e contra imensos inimigos ao mesmo tempo. Há cenas dedicadas à fixeza de cada uma das personagens, em que têm oportunidade de mostrar realmente quão badass são.
Este é um dos aspectos em que David Ayer e a sua equipa realmente se destacam. Esquadrão Suicida é um filme firmemente implantado no Universo Alargado da DC (DCEU) e no entanto parece um filme completamente diferente dos outros filmes que já existem dentro do Universo. A realização e o tom e a energia que daí advém são completamente diferentes. A música no filme também está espectacularmente bem escolhida. Esquadrão Suicida faz para a música dos últimos 15 anos o que Guardiões da Galáxia fez para a música dos anos ’80. A banda sonora é composta por vários dos sucessos pop, rock, hip-hop e da música electrónica mais característicos e populares dos últimos anos, e põem-nos precisamente nos momentos certos, para aumentar ainda mais a fixeza das cenas.
Mas como eu já disse, todas estas componentes do filme existem para servirem de pano de fundo para as personagens poderem esticar as pernas. Foi para isso que compraste o bilhete, não foi? Foi para ver de perto vilões, e para os ver a serem vilões, e a terem as suas aventuras vilanescas, porque já estamos aborrecidos de personagens boazinhas, regidas por códigos de ética rígidos e altruístas. E raios se estes vilões não são divertidos de ver!
O elenco de personagens é grande, e tem figuras tão caricatas e interessantes como um assassino profissional cansado do mundo cínico e que nunca falha um tiro, uma psiquiatra insana que se veste de palhaço, uma entidade interdimensional que foi adorada com deusa pelos índios sul-americanos, um ser humano que parece e tem a força de um crocodilo, um gangster latino que dispara fogo das mãos, um australiano bêbedo, e uma samurai pequenina com uma espada que come almas!
Esquadrão Suicida é um daqueles filmes que foi meticulosamente pensado para agradar aos seus fãs.
Aqui reside o segundo problema que eu posso apontar ao filme. Com tantas personagens tão interessantes eu queria saber muito mais delas, queria mais acerca dos seus mundos interiores, das suas motivações. Infelizmente não seria possível darem tanto foco a todas as personagens, portanto o filme decide focar-se apenas em 3-4 personagens (e mesmo assim não tanto quanto eu gostaria), enquanto que as outras são pouco mais do que bonecos animados que fazem parte do cenário. Mais uma vez, isto é mais uma inevitabilidade do que um erro, e é até possível que tenha sido propositado para deixar a audiência com curiosidade e vontade de ver mais. Se foi isso, então funcionou comigo.
Deadshot, a personagem interpretada por Will Smith, é o tal assassino profissional que nunca falha. O cinismo e atitude prática e terra-a-terra da personagem são muito refrescantes num mundo de vilões espalhafatosos. Will Smith interpreta Deadshot com um à-vontade e confiança que vendem perfeitamente os seus one-liners sarcásticos e atitude honestamente confrontativa. Will Smith sempre foi um dos melhores actores a construir personagens que são pessoas comuns ou normais, e consegue mais uma vez transmitir essa qualidade a Deadshot, tornando-o uma personagem com quem é muito fácil empatizar.
Harley Quinn é outra personagem central da narrativa, e é muito difícil falar-vos dela sem dar spoilers. Margot Robbie faz uma interpretação espectacular, com um alcance emocional enorme, e que me fez acreditar numa personagem que consegue ser por vezes extremamente cómica, por vezes extremamente violenta e por vezes extremamente vulnerável. O seu passado e relação com o Joker são um dos focos da sua narrativa, e gostei imenso como isso é retratado. A sua relação com o Joker é doentia, é perturbada, mas fiquei a acreditar que podia de facto acontecer. Queria imenso explicar-vos mais, mas não quero mesmo estragar a experiência de verem como as coisas se desenrolam.
Outra personagem que eu não posso deixar de mencionar é a Enchantress interpretada pela Cara Delevigne. Esta é uma das personagens que eu mais tenho pena de não ter sido mais explorada. A ideia de uma bruxa interdimensional é demasiado boa para ser desperdiçada, e no entanto sinto que mal arranharam a superfície com a personagem. Haveria tanto mais para dizer da Enchantress e da mulher que ela ocupa, a June Moon, que eu fiquei desiludido por isso não ter acontecido. O mesmo se pode dizer de muitas outras personagens, como já tinha dito antes. A Viola Davis que interpreta a agente do governo que tem a ideia de juntar vilões para lutar contra outros vilões, faz um papel competente, mas não impressiona muito.
Finalmente, e eu não podia não abordar isto, o Joker do Jared Leto é excelente. Joker acaba por não ser uma personagem central da história, funcionando mais como secundário, mas todas as cenas em que aparece são fantásticas. Jared Leto faz uma interpretação brilhante, que consegue não só ir buscar elementos do Joker de Jack Nicholson e de Heath Ledger, mas também criar uma expressividade e maneirismos só seus, que roubam a cena cada vez que ele aparece. Tem a dose perfeita de over-acting.
Todas estas personagens têm imenso espaço para interagir umas com as outras, e esses diálogos são na maior parte das vezes muito bons. As personalidades de cada uma estão sempre muito vincadas e é muito, muito, divertido ver como o assassino cínico interage com a psiquiatra louca, ou como é que o assassino cínico reage ao pirocinético pacificista, e como é que este reage ao australiano bêbedo. O filme tem muito menos momentos cómicos do que o trailer faria supor, mas para mim isso acabou por ser uma coisa boa! Gostei até mais dos diálogos pesados e honestos que estas personagens por vezes tinham umas com as outras. Até queria que houvesse mais.
Em conclusão, Esquadrão Suicida é um filme que pretende ser divertido, que pretende ser uma barrigada de acção e porrada e vilões a fazerem coisas más, e que atinge o seu objectivo magnificamente. Não há nada de subtil acerca deste filme, há muito pouco subtexto, mas isso não é um problema porque o filme não precisa de subtexto ou subtileza para fazer o que faz muito bem. Há alguns problemas na escrita e no ritmo, mas são picuinhices minhas e não afectam o efeito final do filme. Isso é mais do que compensado pelas personagens que são fantásticas, muito divertidas, e a pior coisa que eu posso dizer é que queria muito mais delas.
A DC estava a precisar de um sucesso no cinema, e Esquadrão Suicida é esse sucesso.