Esta é uma série que à partida me entusiasmou pela sua originalidade. Só o facto de ser baseada em histórias creepypasta – contos de terror virais criados e partilhados na Internet – é um enorme ponto a favor de Channel Zero. Confesso que sou uma daquelas pessoas que passa noites inteiras agarrada ao subReddit “no sleep”, a ler as criações macabras e retorcidas de outros utilizadores do site (e que depois não dorme bem durante uma semana). Esta primeira temporada (“Candle Cove”) de Channel Zero conseguiu transpor para o ecrã a estranha sensação que é inerente a estas histórias: o fascínio mórbido que todos temos dentro de nós.
A temática central das recordações falsas ou adulteradas de infância foi muito bem explorada, e penso que é algo com o que todos nós nos podemos identificar. Esta temporada faz-nos lembrar de muitas coisas sobre as nossas próprias infâncias. De resto, a maior parte dos desenhos animados é sinceramente assustadora, e essas imagens são algo que forma parte da nossa identidade enquanto adultos. Recordo-me de vários desenhos animados e programas para crianças que, à luz de uma mente adulta, foram traumatizantes para mim enquanto criança! Na realidade, estes adultos de Iron Hill poderiam ser quaisquer de nós.
Candle Cove, a série dentro da série, é absolutamente arrepiante, quer pelos fantoches quer pela qualidade da emissão, mas especialmente pela música. Essa música vai-me seguir durante algum tempo! Põe-me imediatamente os cabelos em pé. Outro factor muito bem logrado foi a caracterização dos vários monstros, bichos e aparições que foram povoando tanto a vila de Iron Hill como a imaginação de Mike e Eddie. Estas criaturas eram credíveis e tinham um aspecto simultaneamente sólido e etéreo. Outros aspectos, como a cenografia, foram igualmente admiráveis. As cenas filmadas na floresta, ou dentro da fábrica abandonada, ou mesmo dentro da cabeça do Eddie, usufruíram de cenários e de imagens que emprestaram credibilidade aos mais incríveis argumentos sem nunca nos distraírem da história.
Lamentavelmente, e como poderás ver pela pontuação que decidi dar a esta temporada, não foi tudo um mar de rosas. Gostei da temporada e estou ansiosa para ver a próxima, mas houve três elementos que me incomodaram imenso: a qualidade dos actores, a lógica das acções desses actores e o desfecho dado a uma das personagens.
Não há nada pior quando estamos a ver uma série de que gostamos do que sermos arrancados ao estado hipnotizado em que nos encontramos pela má qualidade de um actor. Uma deixa dita sem convicção, uma reacção mal calculada, e subitamente acordamos no mundo real e já não conseguimos acreditar que o que está a suceder no ecrã é a sério. A maior parte dos actores de Channel Zero não têm a alta qualidade que podemos encontrar em séries mais “sérias” (dentro daquelas que eu tenho visto, e apenas como exemplo, A Guerra dos Tronos e Vikings são séries com actores que nunca quebram o papel). Houve alguns actores que se destacaram pela qualidade (a Marina Kerr, como Frances Booth, para dar um exemplo), mas outros que se destacaram pela falta dela (Luca Villacis, que interpretou os papéis de Eddie e de Mike jovem, precisa ainda de algum trabalho).
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Outro problema para mim foi a falta de lógica interna nas acções das personagens. Há um ponto no qual os comportamentos erráticos já não podem ser justificados pelo desequilíbrio emocional das personagens, e penso que Channel Zero ultrapassou este ponto. Uma personagem em especial, Marla, parecia quase bipolar, mudava de ideias em relação aos seus sentimentos por Mike de minuto a minuto. Outra personagem que teve vários momentos irracionais, especialmente no seu tratamento dos filhos, como já mencionei nas discussões, foi a Jessica… Uma série que não se preocupa com a lógica interna – com criar um mundo no qual todas as acções são consequentes – é uma série que não se leva a sério a si mesma, e que se torna portanto menos atraente para mim como espectadora.
Se tiveres seguido as discussões, saberás certamente qual foi o meu terceiro grande problema nesta temporada, que se refere também à falta de lógica interna… O que se passava, afinal, com o “bichinho dos dentes”? A explicação dada no último episódio pareceu-me insuficiente. A sensação com que fiquei foi de que tinham ficado sem tempo para explicar o verdadeiro mistério do bichinho dos dentes…
Em termos gerais, gostei desta temporada, e, como disse, estou entusiasmada para ver o que Channel Zero nos trará no futuro. Como já sabes (ou deverias saber!), a próxima temporada, “The No End House”, estreará no Outono de 2017 e nós cá estaremos para nos arrepiarmos contigo!