American Horror Story chegou à sua 8ª temporada com a promessa de fazer o primeiro grande crossover da série e juntar a temporada Murder House e a temporada Coven numa mega história que iria fazer explodir a cabeça dos fãs. A intenção era boa mas infelizmente de promessas está o inferno cheio.
American Horror Story escusa apresentações. É a série antológica de terror mais popular da actualidade. E a fama é bem dada pois ao longo das temporadas muitas foram as mudanças de fórmula que souberam refrescar a série e mantê-la actualizada. Um dos grandes trunfos, e algo que leva os fãs à loucura sempre que tal acontece, é a ligação entre personagens e eventos de várias temporadas que só são perceptíveis ao mais fã dos fãs. Estes pequenos crossovers tornaram-se tradição em American Horror Story mas nunca foram peça central. Até agora.
Indiscutivelmente a melhor e mais popular temporada de American Horror Story é a primeira. Murder House foi a introdução da série ao mundo e cimentou vários estilos linguísticos que seriam norma nas temporadas subsequentes. O trabalho de câmara invulgar, o “estranho” e “desconfortável” ao invés do terror mais gratuito e sangrento, e a grande reviravolta final. Todos esses elementos são características elementares de American Horror Story que estão presentes em todas as temporadas.
Não é então de estranhar que para o grande crossover da série, Murder House fosse a escolha óbvia. E a outra escolha caiu sobre Coven, a 3ª temporada. Para mim é uma das piores temporadas de American Horror Story mas junto dos fãs foi muito bem recebida e era a ideal para se fazer um crossover. Coven apresentou as bruxas e de atrelado a magia. Até então inédita na série, a magia trouxe imensas oportunidades e as bruxas muito potencial de desenvolvimento. Sendo assim Coven e Murder House eram o par perfeito para concretizar um dos maiores pedidos dos fãs, um crossover a sério!
E o par funcionou muito bem. A história e os elementos de Coven fundiram-se na perfeição com Murder House, no entanto o desenvolvimento dessa relação deixou muito a desejar. American Horror Story Apocalypse diz tudo no seu título. A Terra sofre um apocalipse que dizima quase toda a humanidade. A população restante abriga-se nuns bunkers que foram construídos com o único propósito de albergar quem desembolsou uns largos milhares de dinheiros e alguns escolhidos. A premissa é interessante e de facto os primeiros 5 episódios fizeram salivar este que vos escreve de tão bons e sumarentos que são. Mas depressa o apocalipse começou a descarrilar.
O mistério inicial foi excelentemente bem construído. O que, ou quem, provocou o apocalipse? Quem está por detrás dos bunkers? Porque alguns foram escolhidos para serem salvos? Como tudo aconteceu? Como o apocalipse vai ser revertido? São todas perguntas válidas que alimentam a primeira metade da temporada. Mas a pergunta mais misteriosa de todas é o que raio as bruxas têm a ver com tudo o que se está a passar. E de facto as personagens de Coven não são meras peças de cenário. Oh não, toda a história da temporada é assente nelas. E desta vez as bruxas metem respeito e são muito badass, algo que falhou redondamente na 3ª temporada.
Gostei muito do caminho que decidiram dar ao argumento, de seguir as bruxas e mostrar o que levou ao apocalipse. Todo esse caminho é feito em paralelo com o de uma outra personagem. Personagem essa que é central a American Horror Story Apocalypse e que saiu directamente de Murder House. O desenrolar da história em inverso, ou em flashback, não me fez comichão porque estava completamente dentro da narrativa. A forma como continuaram a história de Coven foi muito interessante e, como fã da série, muito satisfatória. Todos os elementos que foram sendo introduzidos davam mais consistência a uma temporada que, achava eu na altura, estava a caminhar para se tornar uma das melhores de American Horror Story. Mas tudo descarrilou no 6º episódio.
Sendo esta temporada um crossover com a 1ª temporada era obrigatório o regresso à famosa casa de Murder House. A história de Apocalypse não incide sobre a casa da 1ª temporada. É compreensível que se se tratando de um apocalipse o escopo da narrativa seja maior do que o espaço confinado de uma casa. Mas o regresso ao número 1119 de Westchester Pl, Los Angeles, era uma dado adquirido e esperado como o ponto mais alto da 8ª temporada. American Horror Story Apocalypse tinha tudo para fazer uma carta de amor ao fãs. E não foi nada disso. O episódio foi entregue a Sarah Paulson, que é uma excelente actriz mas uma péssima realizadora. Percebe-se porque foi tomada essa decisão. Sarah Paulson é a cara da série mas dar tal responsabilidade a uma estreante atrás das câmaras é arriscado e desta vez o risco não compensou.
E é uma pena. O regresso à casa de Murder House trouxe também o regresso das personagens com que nos apaixonámos em 2011, tal como o regresso de alguns actores que deixaram de colaborar com American Horror Story. Dylan McDermott, Connie Britton, e Jessica Lange, voltaram aos seus icónicos papéis. No entanto, as suas personagens não tiveram o respeito que mereciam e foram pobremente desenvolvidas. O núcleo de Murder House viu todas as suas pontas soltas a serem atadas, num momento que se desviou da narrativa da temporada e não foi mais do que um fan service forçado e completamente desnecessário. Algo que não foi compensado com a realização. Sarah Paulson não teve unhas suficientes para conduzir a câmara pelos corredores e salas da casa de Murder House. No final ficámos com uma pobre tentativa de emular a realização da 1ª temporada e uma oportunidade perdida para fazer um dos melhores episódios da série.
Coincidência ou não, a partir desse ponto o argumento entrou numa espiral descendente e não soube manter a qualidade que mostrou ter na primeira parte da temporada. Os últimos episódios trouxeram ainda mais personagens, e a introdução de ainda mais elementos, mas as coisas começaram a ficar sobrelotadas. As várias narrativas começaram a perder-se e no fim faltaram episódios para amarrar tudo ao ritmo certo. Não ajudou o facto da personagem principal ter tido um desenvolvimento atípico para o que prometia. Mais uma vez, percebe-se o porquê dessa decisão, mas como o tema é o apocalipse era esperado mais pathos e mais grandiosidade ao maior vilão da série, ou que era suposto ser o maior vilão da série. O final de American Horror Story Apocalypse não foi por isso diferente de tudo o resto. Tivemos a famosa reviravolta, sim, mas desta vez não soube a nada. O final foi despido de escala e ficámos com um momento anti-climático e insonso.
Os actores tiveram todos bem, o que é o esperado tendo em conta que American Horror Story tem sempre um elenco de luxo. A realização, no geral, soube imprimir o “desconforto” e o “estranho” que são tão comuns na série. E mesmo as cenas mais pesadas e sangrentas foram bem realizadas. O argumento foi muito forte no inicio da temporada mas não soube lidar com a grandiosidade que criou e perdeu-se no final. American Horror Story Apocalypse tinha todos os ingredientes para cozinhar a melhor temporada de sempre. A história era a certa, as decisões criativas foram as correctas, mas o apocalipse chegou à mesa dos argumentistas e arrasou com tudo.
No fim das contas fica-se com a sensação de que faltava um bocadinho de nada para a 8ª temporada chegar a um patamar confortável de “damn isto é mesmo bom”. Não chegou lá. Fica para o próximo fim dos tempos.