Entrevista a André Lourenço, criador do Trojan Horse was a Unicorn

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Por André Morgado escritor/a em SOMOSGEEKS.PT
Sou uma daquelas pessoas com extrema sensibilidade para os dramas românticos épicos do cinema e de literatura (BD incluída) como:...

O Trojan Horse was a Unicorn inicia-se hoje (decorre de 19 a 24 de Setembro) e está, novamente, a colocar a região de Tróia no mapa internacional por assumir-se como um dos mais importantes espaços de inovação criativa do mundo, durante cinco dias. Entre o agitado horário dos ambiciosos e pujantes projetos que André Lourenço promove para si mesmo, o responsável pelo “evento de e para criativos” – Trojan Horse was a Unicorn (THU) – aceitou almoçar comigo em Lisboa e conversar de uma forma descontraída sobre o seu percurso empreendedor, o seu passado e as suas ambições.

Mas, o que raio é o THU?

Para todos vocês que têm aguçado os níveis de distração do que bom se faz em Portugal, o THU é um dos eventos mais respeitados da indústria de animação 3D e arte digital do Mundo, sendo, nas palavras de André, até mais que isso.

É um evento para todos os criadores terem a oportunidade de criar ligações e oportunidades.

Nos últimos anos, nomes como Scott Ross (trabalhou com George Lucas e co-fundou a Digital Domain, uma das empresas de referência na indústria publicitária), Andrew Jones (vencedor do Oscar para Efeitos Visuais com o filme Avatar e responsável pelos efeitos visuais de Titanic), Syd Mead (criador do universo de ficção de Blade Runner), Sven Martin (responsável pelos efeitos visuais da série A Guerra dos Tronos) ou Paul Briggs (autor do filme de animação Frozen: O Reino do Gelo), passaram por Tróia e partilharam experiências e conhecimentos com todos os que marcaram presença no THU dos últimos anos. Este ano, estarão no nosso país Christian Alzmann, Steve “Spaz” Williams, Brenda Chapman, Doug Chiang, entre muitos outros – cada um mais impressionante que o anterior.

O ano passado tivemos cerca de cinquenta e nove nacionalidades durante os dias do THU, em Tróia. Vieram pessoas da Austrália, do Japão, Brasil, China, Estados Unidos… Imenso pessoal que entende que o THU é uma plataforma de possíveis parcerias, que entendem a relação entre custo e benefício do evento.

Seria de esperar que um evento desta envergadura elevasse o interesse de, pelo menos, centenas de portugueses, mas isso não se verifica.

De facto, 600€ para um bilhete de acesso total a todas os conteúdos do Trojan Horse was a Unicorn parece um valor proibitivo para a maioria das pessoas, mas André explica-nos porque acha essa visão errada e que a dificuldade de Portugal em aceitar o THU não passa por aí.

Em Portugal existe muito a tendência de andar a estudar doze anos de escola obrigatória, mais uma licenciatura, uma pós-graduação e por aí fora. Eu próprio cumpri todos esses passos, gastei dinheiro nas propinas, investi muito nisso. E será que todo esse investimento trouxe um retorno que se veja? E se tiveres a oportunidade de investir uma vez 600€ e gerar um projeto que te dá um retorno muito maior? Continua a ser um valor alto? O evento tem crescido porque há cada vez mais pessoas a perceber que há aqui um retorno efetivo de investimento e que conseguem compreender que o THU quer ser cada vez melhor e mais exigente, quer ser algo que valha a pena fazer uma viagem de dezasseis ou dezoito horas de avião para estar presente.

Entende-se nas palavras de André que o THU não é – nem deseja ser – um evento para qualquer pessoa, não por questões financeiras, mas por questões de motivação criadora.

Se és criador, tens espaço no THU.

O problema é mais profundo. Em Portugal passamos muito tempo a falar e pouco a agir. E quando alguém age e faz algo de relativa envergadura, aparecem os críticos, os mal dizentes, os invejosos e os indiferentes. O que custa mais é ver que grande parte dessa indiferença surge por parte das forças políticas, que não conseguem entender que um festival não é só um festival, é tudo aquilo que ele gera ao fixar-se numa região. Estamos a falar de milhões de euros.

trojan-horse

Em 2015, numa outra entrevista, André disse que Portugal não entendia a área de ação do THU e que isso lhe inviabilizou apoios e ajudas que pareciam chover de outros países.

No entanto, aparentemente, houve uma mudança de atitude das entidades políticas nos últimos tempo.

Ainda hoje recebemos vários contactos de outros países a pedirem para mudarmos o THU para lá, apresentando propostas muito interessantes mesmo. Mas a ideia sempre foi fazer o possível pela minha região e procurei segurar o evento em Tróia até que conseguisse. Com a mudança de governo – e sou apartidário, atenção – houve uma mudança imediata de compreensão da potencialidade do nosso projeto. Enquanto antes só me responderam do Turismo de Portugal em reação a uma entrevista que eu dei ao Jornal de Negócios, onde me queixei de ser mais difícil receber respostas deles do que da Pixar, agora já há abertura para conversar e explanar visões de negócio. Isso é fundamental!.

Talvez essa mudança venha a repercutir-se na forma como os portugueses olham para as áreas criativas que, nas palavras de André, acabam por, muitos deles, ser castrados pelas concepções de vida muito balizadas pelos hábitos extemporâneos, pela forma como se…

(…) pensa muito na minha quinta e pouco no nosso mundo.

 

Se há jovem português que pensou no Mundo e que, aos poucos, o tem vindo a conquistar, esse alguém é o André Lourenço. Mas desengane-se aquele que pensa que sempre foi tudo um mar de rosas.

Aos 27 anos fiquei na falência, com dívidas absurdas para um jovem. O dinheiro que me deviam atingiu um valor tamanho, que fiquei sem conseguir pagar o que devia à banca e em 3 ou 4 meses vi a vida a ir ao buraco. Cheguei a ter vergonha de sair à rua, tive que voltar para casa dos meus pais onde cheguei a comer só sandes, para não transparecer a situação em que me meti. Escondi o problema de toda a gente.

Mas deu a volta por cima, criando novos projetos e hoje, para além de pensar no THU, pensa na sua empresa Black Orange, uma empresa de whitelabel de outsourcing que se mexe muito bem no mercado nacional e internacional.

Nem tudo correu bem.. Talvez 70% das coisas foram menos boas, mas os 30% restantes deram-me para estar aqui hoje.

Mas como surgiu, afinal, a ideia do Trojan Horse was a Unicorn?

Na altura houve a intenção de fazer algo diferente em Portugal, pegando na capacidade real de oferecer serviços para mercados internacionais, elaborando uma estratégia de negócio e de marketing que funcionasse e provasse que conseguíamos, enquanto empresa Yellow Mammoth, fazer melhor que os outros. Uma coisa dá aso a outra. Eu já tinha conseguido trazer a Portugal o Serge Birault, com ajuda do meu amigo José Alves da Silva e a partir daí tinha um elemento de prova que se conseguiam trazer grandes nomes ao nosso país para trabalhar, conversar, partilhar conhecimento. E isso deu-me capacidade para ir lá fora e dizer “Vejam, já consegui o Birault. Quem se segue?” e aí as coisas foram crescendo aos poucos até se dar a ideia de criar o evento.

Movido por um ritmo de conversa entusiasmante, André deixa claro que hoje procura ajudar a que aventureiros semelhantes evitem erros que ele cometeu no passado, tentando fazer a sua parte para incentivar os portugueses a investir mais e mais nos projetos em que acreditam.

Por falar em projetos… Qual será o mais ambicioso deste setubalense?

Evito dizer isso em público para não me acharem completamente maluco (risos). Mas tenho a ambição de fazer da THU TV e da marca THU algo com uma dimensão ainda maior e ajudar na criação de uma indústria competitiva, capaz e forte nesta área, em Portugal.

Com os relógios a marcarem um adiantar da hora, que levou o André a atrasar-se para mais uma reunião – afinal houve assuntos falados que ficam no segredo do Cubo Geek –, findámos a conversa com a mesma energia que contagiou uma hora e meia de ideias e exemplos de perseverança e ambição de alguém que sabe que a diferença faz-se fazendo diferente.

Já conhecias o Trojan Horse was a Unicorn?

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