Foram precisas três temporadas, e finalmente Fargo deu-nos uma história completamente original, livre de ligações ao filme ou às outras temporadas e com expectativas mais elevadas para se saber o que podia ser feito sem estar preso ao passado e às restrições de ter a acção a decorrer no mesmo universo de outras coisas.
A primeira temporada ligava-se ao filme algures a meio, e teve vários momentos que demonstravam passar-se no mesmo universo. A 2ª temporada construiu-se a partir da 1ª temporada, e até teve alguns cameos da primeira temporada. Mas desta vez nada se relaciona com nada do passado. A história da 3ª temporada segue a rivalidade de dois irmãos que se estende por anos até que entra no ponto de ebulição no momento em que os começamos a seguir.
A primeira metade da temporada foi bastante calma, e demorou a arrancar, ao contrário das temporadas anteriores. Serviu para formar as bases que se iriam depois tornar em momentos emocionais e poderosos mais para a frente. Todas as personagens eram pouco mais que caricaturas, e só mais tarde se tornariam personagens a sério, com os quais nos preocupávamos ou que queríamos ver mortos.
Apesar de não ser a temporada mais fluída em termos de eventos, existiram momentos que se destacaram e que ficaram comigo um longo tempo após a sua visualização, mas pareceu faltar algum cuidado com o balanço da narrativa e da importância de dar algo mais ao espectador em certos episódios (particularmente o episódio 03 que não serve de nada e pode ser cortado da temporada, ou esse tempo podia ter sido usado para desenvolver algo mais produtivo).
A segunda metade, no entanto, torna-se numa espiral mortal de violência e momentos grandiosos, e finalmente explorou a fundo todos os temas em que a temporada se centrava (verdade vs propaganda, a tecnologia actual, vingança, etc). Quanto mais tudo se desmoronava, mais as coisas se tornavam interessantes e mostravam que Fargo ainda tem a qualidade de outros tempos. Foi uma segunda metade de temporada negra e intensa.
Mesmo sendo a temporada mais fraca, Fargo continua a ser televisão de grande qualidade.
O que não faltou também foram excelentes interpretações. Ewan McGregor, como os dois irmãos que se odiavam, conseguiu separar bem ambas as personagens nos detalhes, como mais uma prova da qualidade do actor. Mary Elizabeth Winsted volta a mostrar que é uma excelente actriz e que já merecia ter explodido como uma das grandes actrizes da sua geração. Michael Stuhlbarg foi excelente como Sy, o amigo lead de Emmit Stussy. Carrie Coon continua a demonstrar na TV ser uma das melhores actrizes da actualidade. E David Thewlis foi o MVP da temporada, como o sinistro e assustador V.M. Varga, que na segunda parte da temporada se torna um verdadeiro pesadelo para todas as outras personagens.
Todos estes actores contribuíram para que esta terceira temporada de Fargo fosse mais uma de grande qualidade. Noah Hawley também continua a dar asas à imaginação, e com clara liberdade por parte da FX para fazer o que quer, com uma escrita excelente e com momentos memoráveis, que só alguém com uma qualidade tremenda nos pode dar.
O episódio final podia ter sido melhor, mas não desiludiu, e concluiu de forma satisfatória uma forte temporada. As duas protagonistas (Mary Elizabeth Winstead e Carrie Coon) levaram a história para a frente de forma interessante, e a maquiavelice de Varga foi brutal de assistir, sendo que nos deu alguns dos momentos mais fortes da temporada. Sy deu-nos talvez o momento mais triste.
Apesar de ser provavelmente a temporada mais fraca de Fargo, mesmo assim conseguiu ser excepcional em muito coisa e provar que mesmo não estando ao mais alto nível, Fargo ainda é TV de grande qualidade. Apesar da inclusão de uma personagem da primeira temporada (Wrench), esta foi basicamente a primeira temporada sem qualquer ligação de grande nível às anteriores ou ao filme. Demorou algum tempo a construir todos os elementos necessários, mas quando o fez, começámos a sentir-nos preocupados de forma genuína com as personagens, e tivemos direito a alguns momentos devastadores e potentes entregues com uma mestria de escrita fabulosa pelas mãos de Noah Hawley.
Ewan McGregor fez um trabalho tão foda, que eu pensei que eram dois atores diferentes. Essa temporada foi excelente. Mas as duas primeiras temporadas foram épicas.