MARIA MADALENA | Crítica

Uma bela tentativa de mostrar um outro lado da História, mas fica-se pela superfície.

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Por Diogo Simão escritor/a em SOMOSGEEKS.PT
'94. Realizador premiado de 4 curtas-metragens, produtor/apresentador do festival de cinema Shortcutz Faro, co-autor de 3 livros e 3 peças...

Maria Madalena é uma das figuras femininas mais controversas e interessantes da História. A quantidade de interpretações à volta da sua figura já gerou uma boa pletora de parte de filmes, séries e livros. E, pela “primeira vez”, será retratada com a justiça e individualidade que lhe é devida. Pelo menos é isso que o realizador, Garth Davis (Lion- A longa estrada para casa), e os produtores (os mesmo de O Discurso do Rei) garantiram em entrevistas antes da estreia…

Conhecemos Maria (Rooney Mara) ao largo da costa. É facilmente destacada do resto da multidão pela sua independência de acções e fervor na fé: algo que não assenta bem com o patriarquismo da altura. Quando Jesus (Joaquin Phoenix) a encontra o seu olhar de alienamento torna-se num de devoção e, quiçá, algo mais. Apesar das promessas dos responsáveis pela produção, o filme não explora novos meandros desta história milenar. De facto a protagonista é Maria e não Jesus, mas tudo o resto permanece imutável. Não há uma particular diferenciação nos paradigmas apresentados, apesar do contexto ser visivelmente diferente de homens para mulheres.

Amem o próximo”, “Sigam o vosso coração e não a vontade de quem vos oprime”. Excepto uma pequena cena (que mesmo assim podia ter sido muito melhor esmiuçada), não há diferença entre a mensagem deste filme e a de qualquer outra película cuja narrativa assente na Ressureição. Não quero com isto dizer que se deveria ter adulterado uma história que já se encontra no imaginário mundial: mas ao alterar a direcção da “fonte de luz”, o resto da imagem deveria ter-se metamorfoseado.

Aliás, a fotografia é, sem dúvida, o ponto mais forte do filme. Greig Fraser (Rogue One: Uma História Star Wars, 00:30 A Hora Mais Negra) apresenta-nos o primeiro século desta era com um estilo bem indie, equilibrando as paisagens imutáveis, os grandes planos dos olhos azuis de Phoenix e Mara e tracking shots no limiar do foco (perdendo-o muitas vezes). É a própria fotografia que reforça o poder dos atores, não colocando muitas barreiras entre nós e as suas morosas (re)acções.

A lentidão no desdobrar do filme faz com que as duas horas sejam arrastadas.

É justo dizer que as interpretações são o que de mais original o filme tem a apresentar. Consegue jogar com algumas das ideias preconcebidas sobre as personagens e conferir-lhes nuances bizarras. É um risco que pode alienar alguns públicos, mas também mostrar-se estimulante para outros. A banda-sonora, embora sobrecarregada de sentido por ser a última com a assinatura do falecido Jóhann Jóhannsson (Sicario – Infiltrado, Arrival – O primeiro encontro), não consegue emocionar, distraindo muitas vezes com tons eletrónicos completamente fora de contexto para o período e tom apresentados. Os retoques de Hildur Guðnadóttir no produto final não podem, nem devem, ser ignorados.

A lentidão no desdobrar do filme faz com que as duas horas sejam arrastadas. Há algum poder, mas sem grande desenvolvimento de personagem ou acções fortes a pautá-las, fica-se sempre perdido em olhares e divagações. Trocas de diálogo inteligentes arrebitam o espírito, mas o tom exasperado de Phoenix coloca a interrogação se ele e/ou Ele estavam a gozar connosco. As personagens secundárias têm, efectivamente, alguma força: mas sem ser Chiwetel Ejiofor (12 Anos Escravo, Doutor Estranho) no papel de Pedro e Tahar Rahim (O Profeta, O Dia do Falcão) enquanto Judas, é pouco provável que te lembres de mais alguém.

As palavras finais expõem o filme: foi uma bela tentativa de mostrar um outro lado da História, mas fica-se pela superfície. Ironicamente, ou não, Maria Madalena começa e acaba com imagens da personagem titular debaixo de água. Continuo à espera do filme que nos leve até ao fundo com ela.

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