“The Honeymoon”
Chiça que este episódio foi bom! Não foi perfeito, mas foi muito bom! Felizmente o principal problema do episódio fica despachado logo nos primeiros minutos.
O episódio abre com o Coulson e o Talbot perdidos na neve, e a Daisy e a May no Zephyr a tentarem encontrá-los. Estas cenas são competentes, e claramente a história estava a ir na direcção de eles os resgatarem, e isso tinha de ser mostrado de alguma maneira. E também faz sentido que eles quisessem passar por essa exposição rapidamente; há coisas mais interessantes para contar neste episódio.
Mas apesar disso tudo, a edição ficou péssima. Há ali em particular um corte, imediatamente depois de a Daisy dizer que quer aterrar para dar ao Coulson a oportunidade de os encontrar, que é tão desconjuntado e estranho. Num momento a Daisy está no avião, e 2 minutos depois está em terra a salvar o Coulson e o Talbot da Ruby. Não está subentendida nenhuma passagem de tempo, não há sequer um compasso de espera, uma desaceleração do ritmo para marcar a diferença entre as duas cenas. Porem um separador a preto com a frase “Scene Missing” tinha sido menos estranho do que o que fizeram.
Mas apesar destes erros técnicos que, honestamente, reduzem a qualidade geral, esta temporada está a ser brilhante é pelos desenvolvimentos das personagens principais (como disse o Daniel no HYPE). Durante o resgate do Coulson e do Talbot, depois da Daisy desancar a Ruby (e eu estou muito entusiasmado para o rematch) o Deke tenta ser útil e leva um tiro, obrigando a Daisy a salvá-lo. A discussão que ela tem com o Deke pouco depois mostra-a zangada e frustrada com o Deke, e ele chama à atenção que ela está a lidar mal com o papel de liderança.
Já há imenso tempo que estávamos a ver que a Daisy caminha para ser a Directora da S.H.I.E.L.D., e isso seria interessante por si só. Mas o que é mais interessante é que neste momento estamos a ver uma versão da personagem da Daisy que é ela a lidar mal com a transição. A própria May diz isso ao Coulson num diálogo mais à frente. A personagem da Daisy não é perfeita, diz e faz coisas erradas, não está no seu melhor como resultado do conflito interno que está a passar, e esse conflito decorre perfeitamente do enredo, que por sua vez decorre das ideias de ficção científica. O crescimento da personagem vai acontecer quando ela resolver este conflito interno, mas entretanto a maneira como esta transição está a ser representada é muito interessante, mostra-nos uma versão desta personagem que ainda não tínhamos visto antes, e vai tornar essa resolução final tão mais satisfatória.
Também a relação entre a General Hale e a sua filha assassina a Ruby está particularmente interessante. Para começar a Hale é uma personagem que corria sérios riscos de ser completamente esquecida pelos escritores. Claramente a principal função dela é servir de obstáculo à S.H.I.E.L.D. e ser progenitora da Ruby; e para ser honesto, se tivesse ficado por aí ela já seria uma personagem competente. Mas a decisão deles de lhe darem tanto backstory, tantas camadas e profundidade torna-a uma personagem extremamente interessante, o que por sua vez dá imensas dimensões às discussões que ela tem com a filha Ruby.
A Ruby por sua vez é uma mistura de ingenuidade, insegurança, violência e ambição fascinantes. Vê-la a ser fechada no quarto e tirarem-lhe as suas coisas reforça o quão prisioneira realmente é nesta situação, e chama atenção para a manipulação emocional quase mesquinha que ela sofre por parte da mãe. Isto cria-nos imensa empatia por ela, mesmo quando isso foi um castigo por ela ter quebrado ordens e tentado matar uma pessoa. É uma representação de uma adolescente rebelde com a qual é impossível não nos relacionarmos.
A discussão que ela tem com a mãe mais para o fim do episódio está extremamente bem escrita. A raiva e revolta da Ruby fazem imenso sentido, as suas acusações são legítimas, e a comparação que ela faz entre a mãe e o Whitehall é brutal. O momento em que a Ruby explica que só quer a aprovação e o amor da mãe mostra uma interpretação excelente da Dove Cameron, e revela uma vulnerabilidade da personagem que contrasta imenso com a sua frieza assassina apenas momentos depois quando se junta ao Strucker. Esta relação entre eles também é muito muito curiosa. São duas personagens jovens, que se querem rebelar das suas figuras paternais, que se juntam num trajecto de violência, alimentando a loucura um do outro, muito reminiscente de personagens com Bonnie e Clyde (Bonnie and Clyde, 1967) ou Mickey e Mallory Knox (Natural Born Killers, 1994).
Enquanto estas coisas todas vão acontecendo, a Jemma, o Fitz e a Yo-yo estão na sua missão clandestina “ah-e-tal-somos-imortais-por-causa-de-paradoxos-temporais” para se infiltrarem nas instalações da HYDRA onde acreditam estar tecnologia importante (acho que era suposto ser uma arma de gravitonium, mas depois acaba por ser uma coisa diferente). Chegam lá ao mesmo tempo que o Anton Ivanov, conseguem encontrar o Processador de Flebotinum Aplicado, que é muito reminiscante da Câmara de Vita-Rays de Capitão América: Primeiro Vingador, 2011.
Quando estão a preparar-se para destruir equipamento, a Yo-Yo finalmente revela que eles têm de deixar o Coulson morrer. Honestamente já nem me lembrava deste plot-point, mas é interessante porque cria um conflito moral muito dramático dentro da equipa, e aumenta imenso as consequências de tudo o que eles estão a fazer. Também percebemos que a Yo-Yo aparentemente não consegue usar os seus poderes de super-rapidez porque os braços não suportam essas velocidades. Que é uma maneira espertalhona de criar limitações a personagens com poderes de velocidade, que são sempre difíceis de escrever de maneira lógica. Por exemplo, a luta final entre ela e o Ivanov não faria sentido se ela ainda tivesse super-velocidade.
As novas limitações da personagem não só são justificadas pelo enredo, como também fazem sentido para a construção da narrativa, permitindo-nos uma versão nova da Yo-Yo, que nunca tínhamos visto com tanta agressividade física e em beast-mode. Também é mais um exemplo de como esta temporada está a perder o seu tempo para desenvolver as personagens, pondo-as face a complicações e obstáculos novos, de maneira a mostrá-las de maneiras novas. Neste momento temos uma Yo-Yo que trocou os seus poderes de super-velocidade por poderes de super-força, e também não está a lidar bem com essa transição.
O desenvolvimento da Jemma e do Fitz por esta altura já é uma força da natureza, e a força do seu amor um pelo outro é expressa de maneira brilhante. O próprio Fitz agora que evoluiu para o Dr. Fitz, parece estar mais mordaz e sarcástico, dando um tom diferente à personagem. A aceitação da Jemma por este novo Fitz é inspiradora, e aquele momento em que eles dizem que não voltam a sair do lado um do outro é a coisa mais enternecedora de sempre, coberta de sobretons de tragédia e perda. E eles juntos são tão badass! A cena de tiroteio entre eles e os robôs está brutal! Está filmada de uma maneira muito interessante, mais uma vez usando câmaras portáteis e planos de sequência sem cortes para aumentar a tensão, e permitindo frases como “I’m protecting England from evil robots with the man I love“.
Também acho brilhante que no meio do tiroteio, exactamente quando espectador está a pensar “Porque é que eles estão tão preocupados? Eles sabem que vão sobreviver!” a Jemma pede precisamente ao Fitz que a reconforte explicando de novo como o tempo é imutável. É giríssimo como isto encaixa bem com o comentário do Daniel na última discussão: “a Simmons ao embarcar na cena do sou imortal está automaticamente a negar a possibilidade para a qual está a trabalhar” e agora vêmo-la a pôr precisamente isso em causa. Depois de eles se safarem e pensarem que conseguiram mudar o tempo porque destruíram uma componente essencial ao funcionamento da máquina, chega a Ruby e o Strucker, que os obrigam a reparar a máquina, e afinal ainda estão no caminho pre-determinado para a destruição. É genial como os escritores estão propositadamente e constantemente a brincar com as constantes subversões e confirmações do conflito central da dificuldade de mudar a linha temporal.
Pelo meio disto tudo vemos a parvoíce pegada do Mack a operar o Deke. É talvez o género de coisa que me irrita a mim mais do que ao público geral, mas acho que é um bocado de abuso à suspensão da incredulidade pedirem-me para acreditar que o Mack, sem nenhum tipo de treino, é capaz de fazer cirurgia cardiotorácica guiado por alguém que está a ler o manual. Mas vale a pena para ver o Deke drogado no fim, que é hilariante!
E oh meu deus, a cena pós-créditos é tão boa! Depois de passarem tanto tempo a mostrar o Talbot como uma personagem adorável, divertida (“For the love of flapjacks!“), trágica, a fazer-nos mudar de opinião acerca dele, para depois o mostrarem no seu melhor, só a querer falar com o filho e dizer-lhe que o ama… e no fim ele é um agente infiltrado da HYDRA!?!! Que reviravolta! Apanhou-me completamente de surpresa! E no entanto faz imenso sentido que a Hale soubesse que a S.H.I.E.L.D. ia tentar resgatá-lo e que provavelmente ia pô-lo em contacto com a família; faz imenso sentido que lhe tivessem feito uma lavagem ao cérebro à-la Soldado do Inverno! É tão bom!!!
Eh pá, a série está com uns problemas aqui e ali, mas raios que os momentos altos são mesmo muito bons!