A primeira coisa a ter em mente é que o Viagem à Terra do Nunca é um filme para crianças.
É muito bonito! Visualmente o filme é lindíssimo. As cores são vibrantes, os cenários são impressionantes, o mundo criado é verdadeiramente arrebatador.
O eye-candy é abundante.
As sequências de acção estão todas extremamente bem coreografadas e nunca são confusas. Há uma energia dinâmica que é contagiante.
Os barcos piratas voadores foram os meus preferidos, e a principal força do filme é conseguir que o ambiente e atmosfera transmitam uma verdadeira sensação de divertimento e aventura.
Mas é um filme para crianças.
O que significa que a história é absolutamente linear e previsível. A narrativa é competente o suficiente para justificar que as coisas não acontecem, simplesmente, só porque sim. Tem um ritmo rápido para as crianças não se distraírem demasiado, e há muito humor simples de pessoas a levarem pontapés.
Abundam as “mortes-à-Disney”, sempre sem sangue e a cair para as profundezas até se deixar de ver o corpo, e mesmo os índios explodem em nuvens coloridas quando morrem.
O filme começa com cenas muito à Oliver Twist, até que a nossa criança-protagonista foge do seu orfanato para um mundo de aventura onde vai aprender valiosas lições sobre amizade e a acreditar em si mesma.
É enternecedor.
As personagens são todas perfeitamente unidimensionais e com motivações perfeitamente simples.
O Peter Pan quer encontrar a mãe, o Black Beard quer viver para sempre, o Hook quer fugir, a Tiger Lily quer proteger o seu povo.
O conflito é simples e a sua resolução também. Mais uma vez, isto é um filme para crianças.
As interpretações são completamente exageradas, e gera-se aquela situação ligeiramente constrangedora em que temos a impressão que todos os actores percebem que o filme é uma piada, excepto a criança actor-principal que está genuinamente a tentar fazer uma boa interpretação.
Dito isso, o Levi Miller faz uma boa interpretação, notando-se que está genuinamente a dar o seu melhor, e é uma pena que ninguém lhe tenha explicado a piada.
O Garrett Hedlund faz a sua melhor imitação do Indiana Jones, e a Rooney Mara faz pouco mais do que respirar e ter uma cara estranha.
A melhor pérola deste filme é mesmo o Hugh Jackman, numa interpretação absolutamente exagerada, over-the-top, e deliciosamente cativante! Nota-se o quanto o Hugh Jackman se divertiu a interpretar esta personagem que é das mais interessantes do filme todo.
Menção especial à banda-sonora, que logo ao início usa, de forma anacrónica, o Smells Like Teen Spirit dos Nirvana e a Hey! Oh! Let’s Go!!! dos The Ramones! Ambas as músicas são usadas de forma muito eficiente, mas parece que se esquecem disso nos outros dois terços do filme, porque nunca mais usam outra música popular.
Na realidade, fiquei espantado por ver o Joe Wright a realizar este filme de aventura para crianças, estando eu habituado a vê-lo noutros filmes muito mais adultos, introspectivos e lentos, como Orgulho e Preconceito (2005), Expiação (2008) e Hanna (2011).
Mas pronto, é um filme para crianças, e todas estas coisas que eu estive aqui a dizer são razoavelmente irrelevantes, porque o que importa é que as crianças se divirtam, e isso está garantido com este filme.
Infelizmente, quem vai ao cinema são adultos, e este é um site para adultos, e como adultos que somos, estas falhas são flagrantes. Isso nota-se no facto de que o filme custou 150 milhões de dólares e até agora só rendeu 15 milhões, sendo que provavelmente vai fazer dezenas de milhões de dólares em prejuízo à Warner Bros.