A Rapariga Apanhada na Teia de Aranha
Det som inte dödar oss
Crime, Mistério, Thriller
29 de Setembro de 2015
Suécia | 2015
Dom Quixote
Uma noite, Blomkvist recebe um telefonema de uma fonte confiável declarando ter informação vital para os Estados Unidos. A fonte tinha estado em contacto com uma jovem mulher, uma super-hacker que se parecia com alguém que Blomkvit conhece bem de mais. Blomkvist, a precisar urgentemente de um furo jornalístico para a Millennium, pede ajuda a Lisbeth, que, como habitualmente, tem a sua própria agenda. As consequências são surpreendentes.
David Lagercrantz
Uma das melhores piadas do falecido Douglas Adams apareceu na capa do seu livro que anunciava «O quinto livro na cada vez mais imprecisamente chamada Trilogia Hitchicker».
A Trilogia Millennium – os três livros do escritor Stieg Larsson que foram descobertos depois da sua morte em 2004 de um massivo ataque de coração e publicados postumamente – segue agora pelo mesmo caminho, com uma nova sequela comissionada pelo património de Larsson ao escritor sueco David Lagercrantz.
Mas o lançamento deste livro está envolto em tanta intriga, secretismo, paranóia e lutas familiares que a vida real parece estar a querer imitar um enredo imaginado por Stieg Larsson.
Pois embora os editores garantam que A Rapariga Apanhada na Teia de Aranha vai agradar a todos os fãs dos livros originais, nem toda a gente está feliz com esta publicação.
Eva Gabrielsson era companheira do jornalista há mais de 32 anos quando este faleceu, e como infelizmente não eram casados, todo o património de Larsson foi dividido pelo pai e irmão, deixando-a completamente de fora de quaisquer decisões relacionadas com as personagens e mundos inventados pelo grande amor da sua vida.
Gabrielsson já dissera previamente que Larsson tinha escrito mais de 200 páginas de um quarto livro na série, mas que enquanto ela tivesse o manuscrito nas mãos estas nunca seriam publicadas – por isso a editora sueca Norstedts resolveu ignorar totalmente os planos do escritor original e inventar uma narrativa completamente nova para a sequela.
Mas com a segurança à Harry Potter – David Lagercrantz escreveu o livro todo num computador sem acesso à Internet, entregou o manuscrito à mão num envelope fechado aos seus editores e nenhum jornalista teve acesso ao livro para review antes da sua publicação – este tornou-se num dos livros mais esperados do ano, ficando apenas atrás de Go Set a Watchman de Harper Lee.
Mas qual é o resultado final?
Para começar, Lisbeth Salander – uma das personagens mais originais dos últimos anos – continua tão sanguinária, tão vingativa e tão maluca como sempre, mantendo-se surpreendentemente admirável devido à cuidadosa escrita de Larsson nos livros anteriores. Mikael Blomkvist continua um homem com uma moral duvidosa, cuja carreira agora no novo livro se encontra nas últimas devido a duas antigas ameaças ao jornalismo profissional – a bebida e a preguiça – e também uma mais moderna – a Internet.
A Rapariga Apanhada na Teia de Aranha mostra-nos o par a ser atraído para o caso do enigmático Frans Balder, um perito proeminente na Inteligência Artificial que deseja passar de IA para SIA, ou Super-Inteligência Artificial, criando cérebros para máquinas infinitamente superiores aos dos humanos. As suas experiências acabam por o entrelaçar numa intriga global, envolvendo a Polícia de Segurança Sueca (Säpo), a máfia russa, Silicon Valley, espiões industriais e interesses de segurança nacional dos Estados Unidos.
Os esforços de Lagercrantz para ligar o enredo a atos desagradáveis na Suécia com maquinações dentro da Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos não funcionam muito bem – trata-se de uma tentativa óbvia para capitalizar com as revelações de Edward J. Snowden sobre a agência e o debate sobre os seus métodos de vigilância.
Mas também os fãs não se apaixonaram pelo Os Homens que Odeiam as Mulheres por causa da sua estrutura narrativa – que realmente dependia demais em clichés de filmes de assassinos em série diretos-para-vídeo. Não, apaixonaram-se pelo livro e as suas sequelas devido ao charme de Salander e Blomkvist e a química entre eles.
E embora teria sido melhor se Lagercrantz tivesse limitado um pouco as personagens que acabam por tornar a história um pouco densa demais, ele de facto capturou – bem, o melhor que conseguia – a exaustão vulnerável que se esconde debaixo do bravado das duas personagens principais.
Sem dúvida que o melhor do livro são as cenas que juntam a genial Lisbeth Salander e August, o filho autista de 8 anos de Balder, nas quais podemos ler as interações entre o pequeno génio em artes e matemática e a mulher que talvez também esteja algures no espectro de autismo.
E tal como aconteceu nos livros anteriores, este mostra-nos um pouco mais do passado de Lisbeth, lançando uma nova luz sobre como esta mulher que começou como vítima se tornou uma sobrevivente feroz, e conseguiu reinventar-se numa espécie de vingativo anti-herói. E pela primeira vez surge Camilla Salander, a afastada irmã gémea de Lisbeth, depois de ter sido ocasionalmente mencionada nos títulos anteriores, logo no primeiro livro pela mãe das duas.
Mas é difícil falar sobre o enredo de A Rapariga Apanhada na Teia de Aranha, porque é um thriller – e tal como todos os livros do género, saber-se demasiado sobre a história antes de se começar a ler pode arruinar por completo a experiência de tentar juntar as peças juntamente com as personagens.
A escrita poderá ser o que os fãs mais estranharão e que pode até afastar os fãs mais die hard da série – não é má, pois David Lagercrantz é um romancista habilidoso, mas falta ao livro o Je ne sais quoi dos originais.
A Trilogia Millennium era mais confusa e excêntrica que muita da literatura popular – sem dúvida que se Stieg Larsson não tivesse falecido os livros teriam sofrido mais algumas revisões antes de serem publicados –, enquanto A Rapariga Apanhada na Teia de Aranha é um livro menos sangrento e menos de horror que os seus antecessores e é também uma leitura mais limpa e mais concisa.
Isso não é mau, nem deveria ser uma crítica, mas o contraste será estranho para os leitores, principalmente para aqueles que recentemente releram – ou leram pela primeira vez – os outros livros, e poderá demorar um pouco a serem puxados para dentro das páginas.
Concluindo, este é um livro que tenta mostrar respeito aos originais sem se tornar pastiche, e que se manteve fiel às caracterizações das personagens principais, e nesta série isso é sem dúvida o mais importante.
Há muito a discutir se livros de continuação deveriam ser escritos de todo, mas A Rapariga Apanhada na Teia de Aranha é um trabalho competente por parte de David Lagercrantz, que irá atrair os leitores apesar de vários buracos e lombas pelo caminho.
No entanto é bem possível que os fãs mais obstinados e fervilhosos considerarão isto nada mais do que fanfiction não autorizada e odiarão cada palavra e cada ação das personagens – e terão razão, no seu direito.
E a história deixa muito a desejar entre Salander e Blomkvist, o que aumenta a possibilidade que surjam os dez livros que Stieg tinha alegadamente planeado.
Pena não termos acesso à sua visão original.
O livro estará à venda em Portugal a partir de 29 de Setembro.
Vão ler este livro? Qual é a vossa opinião em escrever livros sem o autor original?
O escritor tentou manter-se o mais fiel possível às personagens originais e à "escuridão" do mundo criado por Stieg Larsson, respeitando o que veio antes.
A diferença na escrita pode afastar os fãs mais renhidos da série.
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Johanna Breskinha