Himitsu: The Revelation
秘密(トップシークレット)The Revelation
Mistério, Crime, Psicológico, Sci-Fi
M/18
Japão | 2008
26 Episódios
Madhouse
Video Audio Project
E se fosse possível extrair dois ou mais anos da memória de uma pessoa (projectados em imagem num ecrã para todos poderem ver) do cérebro depois de a pessoa morrer? Isso iria certamente ajudar a resolver casos difíceis de homicídio já que as memórias iriam mostrar os momentos finais das vítimas. Mas a que custo? O que acontece à privacidade dos mortos enquanto estranhos vasculham as suas memórias mais privadas? E os efeitos que as imagens podem ter nas pessoas cujo trabalho é presenciar as mentes de assassinos psicóticos e experimentar as emoções que esses assassinos sentiram enquanto esfolavam e estripavam as vítimas?
Estava a ler recomendações para quem gosta de Psycho Pass quando encontrei Himitsu, uma série psicológica, que me interessou bastante, apesar da fraca qualidade dos episódios online.
Na minha opinião, esta é uma série muito boa, a nível de desenvolvimento de uma história de mistério, mas ao mesmo tempo tem muitas falhas. Consegui perceber algumas enquanto via o anime, e percebi outras ao ler reviews, por isso só vou falar de alguns aspectos da série.
Na sua essência, Himitsu é uma série de policial, principalmente de episódios únicos, e com alguns casos que se estendem por mais de um episódio. É só a meio da série que começamos a encontrar ligações entre os casos, o que leva ao desenrolar final. A série baseia-se na existência de um sistema de MRI (magnetic resonance imaging, ressonância magnética) que torna possível ver imagens da mente das vítimas de assassínio, de forma a descobrir o assassino. Claro que estas imagens são obtidas a partir do cérebro de quem já morreu.
O Aoki (a personagem principal) fica chocado com o que se pode descobrir sobre uma pessoa e como ela vê o mundo a partir de memórias, e em como o interior por vezes é tão diferente do exterior, como se alguém tivesse posto a capa errada num livro.
Então, a começar pela história das MRI, este é um avanço tecnológico enorme, que é o único traço de sci-fi na série. O que não bate certo é que, a par deste avanço tecnológico, o restante funcionamento policial é muito à velha guarda, com relatórios escritos à mão e arquivos de casos anteriores também só em papel.
Logo no início da série, é-nos explicado que só se pode aceder a memórias de que a pessoa se recorda, sendo as mais fortes as dos momentos anteriores à morte, e as memórias mais importantes. Isso torna mais difícil ver memórias antigas, que normalmente aparecem mais desfocadas e com cortes. O mesmo acontece se o cérebro tiver sido danificado.
A outra particularidade das imagens de MRI é que correspondem à visão que a pessoa em questão tinha do mundo. Por exemplo, nalguns episódios podemos ver que as pessoas amadas aparecem mais bonitas do que na realidade. Outros casos são o aparecimento de ilusões das vítimas nas imagens, ou deformações, como um homem que não via caras, pelo que as pessoas apareciam totalmente sem expressão (nesta personagem, essa situação devia-se a características psicológicas, e não a alguma doença que afectasse o reconhecimento facial).
No entanto, ao longo da série, assistimos a algumas realidades, como fazer zoom e focagem a alguma coisa escrita num papel, quando a própria pessoa não devia estar a tomar atenção suficiente ao pormenor para guardar uma memória tão detalhada. O mesmo acontece com reflexos, num caso mais credível o reflexo dos óculos solares, e noutro o reflexo de uma talher, se não me engano, em que a imagem era tão pequena que a pessoa nem devia ter reparado.
Por último, as MRI mostram apenas imagens, sem qualquer reprodução de som, pelo que é preciso ler os lábios para perceber as conversas. Em geral, a apresentação detalhada das imagens MRI vai contra o conceito das mesmas, em que uma pessoa só guarda memória do que é importante.
O outro ponto da série que me confunde são os assuntos polémicos. Estes são abordados de forma leve, sem grande discussão. Podem receber algum foco num momento, e depois não voltam a tocar no assunto.
Por exemplo, a discriminação e falta de aceitação quanto à secção 9. A maioria dos cidadãos tem dificuldade em aceitar que haja pessoas a ver as memórias de outras, por serem algo de tão pessoal, principalmente quando se trata dos seus familiares. No entanto, não há uma verdadeira discussão do assunto. Quanto muito, há a repetição da ideia de que estão a ver segredos que as pessoas queriam levar para a tumba, e a posterior aceitação dos membros da secção 9 de que só fazem isso para descobrir os assassinos.
Há uma altura em que parece que o Aoki gosta da irmã, de uma forma que sugere incesto. No fim desse episódio ele diz que espera que chegue o dia em que a vê apenas como um membro da família. Noutra há um homem que parecia amar uma das filhas. No entanto, a veracidade dos sentimentos, tanto do homem como do Aoki, nunca é posta a pratos limpos, nem há comentários da personagem sobre isso ser certo ou errado, e porquê.
Outro exemplo são os casos de corrupção policial. É-nos mostrado que os membros da secção 9 são contra, mas não há uma verdadeira discussão do assunto, como se estivesse ali por estar. Por último, temos os casos de experimentação humana. À semelhança dos casos de corrupção, estão ali por estar, são essenciais à história, mas falta ali a discussão do assunto, a discussão de ética. Só vemos a opinião das personagens, tanto dum lado como do outro, mas não há um ponto intermédio, a aproximação dos pontos de vista e pesagem entre métodos e fins.
Quanto às personagens, posso dizer que fiquei surpreendida. O Aoki, a personagem principal, está nos seus 20s ou 30s, não é especialmente atractivo e presta mais atenção ao trabalho do que à família; ele nem é o típico protagonista carismático, ou aquela pessoa calculista e calada , nem cai noutro tipo de cliché típico. É uma pessoa com virtudes e falhas, como qualquer outra, e essas falhas não são tapadas só por ser o protagonista.
A personagem mais importante depois dele é o Maki, o Chefe da secção 9. Mais uma vez, ele é um retrato humano, e são esses retratos humanos o ponto forte de Himitsu. A série, em vez de nos apresentar ideias fictícias do que é a vida, numa espécie de mundo cor de rosa, apresenta-nos finais tristes e criações horrorosas, fruto da mente de pessoas alucinadas ou de assassinos brutais.
Ficamos então com uma série deveras interessante, que se tivesse sido melhor pensada, seria muito mais reconhecida.